23 de nov. de 2009

O desaforo bom da poesia, com Fabrício Carpinejar


O vencedor do Prêmio Jabuti 2009 realiza Oficina de Criação Literária na Biblioteca Central de Cubatão. Sala lotada e muitas provocações no melhor estilo do autor
          Se “Carpinejar” fosse um verbo poderia ter como sinônimos: provocar, desafiar, instigar, despertar. E se pudéssemos conjugá-lo, seria usado para a criação literária. Isso porque é impossível dissociar essa imagem desse sobrenome que poderia ser verbo: “Carpinejar”. Ele pertence a Fabrício Carpinejar, escritor, pai, jornalista, professor, gaúcho e uma figura sincera e desafiadora. O autor participou da Oficina de criação literária na quinta-feira (19/11) na Biblioteca Central de Cubatão. Foi mais uma etapa do Projeto Viagem Literária.
          Sujeito extremamente provocador, Fabrício levou as pessoas a uma viagem em torno delas mesmas, conhecendo seus próprios erros e defeitos, enfrentando-os de maneira direta, sem se preocupar com o vírus da aceitação social. Propôs exercícios de criação literária: “Escreva aí um horóscopo para você mesmo apontando um defeito seu”, disse. “Nunca pensei nisso”, matutou a maioria. E com certeza foi essa idéia inédita que impulsionou os participantes a praticarem sua própria literatura. Fabrício opinou, corrigiu, “carpinejou” as pessoas a olharem suas poesias, poemas, contos e romances de maneira particular. Para ele, o poeta é invisível mas sua literatura tem que tocar o leitor de maneira direta.
         O escritor falou sobre foco, figuras de linguagem, contemplação do poema e defendeu a tese de que fazer literatura é um exercício. “O leitor não vive dentro da nossa cabeça, temos que criar nossos próprios leitores. E isso se faz escrevendo. A Literatura é para quem não consegue fazer outra coisa. Você se arrisca, pois pode não agradar as pessoas. E ainda assim, continua fazendo”, disse. Fabrício parte da premissa de que o autor precisa ser verdadeiro e isso inclui o enfrentamento que ele propõe na Oficina. Aceitar os medos, fracassos e enxergar tudo isso com muito bom humor. Para Fabrício, na poesia há “golpe de estado” e por isso o poema não aceita “perfumaria”, somente ação. Carpinejar não defende o sentimentalismo barato e pobre.
          A idéia da Oficina se cumpriu à risca: descortinar um mundo diferente para aqueles que se aventuram na literatura. E nada melhor do que estar ali absorvendo toda bela loucura do escritor. Ele, que recebeu em 2009, o Prêmio Jabuti (um dos mais importantes do Brasil) na categoria Contos e Crônicas com o texto “Canalha!”. Em 2003 sua publicação “Biografia de uma árvore” foi escolhido o melhor livro de poesia do ano pelo Prêmio Nacional Olavo Bilac, da Academia Brasileira de Letras. Um ano antes, já havia recebido o Prêmio Cecília Meireles da União Brasileira de Escritores. O vasto currículo não o afastou do contato com as pessoas pois ainda hoje é professor na Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
          Para o escritor, o trabalho das bibliotecas é justamente suscitar grandes poetas e isso vem do exercício da escrita. Um exemplo disso é o jovem cubatense Victor Melo. “Quero ser escritor, mas preciso me aperfeiçoar. E nada melhor do que começar dessa maneira”, afirma o adolescente que adora folhear Cecília Meireles e Carlos Drummond de Andrade. Aos 14 anos, Victor confessa já estar escrevendo um livro: “é uma história de terror, de um rapaz de 16 anos que começa a investigar situações estranhas que acontecem na cidade”, revela.
          O Projeto Viagem Literária previa no máximo 30 pessoas na sala, mas o número de inscrições excedeu esse limite. Eram poetas, donas de casa, professores, curiosos, leitores assíduos de todas as idades. A figura performática de Fabrício Carpinejar o arrasta a quilômetros do lugar comum. Como ele próprio já disse, escreve poemas como quem existe. “Ninguém hesita em existir. Percebo a poesia desde o princípio como um crime passional”, disse uma vez. E pelo que percebemos, também segue por aí, “carpinejando” a vida dos outros. Que bom.
Texto: Morgana Monteiro
Foto: Dilson Mato Grosso




2 comentários:

  1. Morgana, seu texto sobre a oficina ficou perfeito!
    é isso mesmo, quem não assume seus defeitos não sabe o que é VERDADE. Carpinejar é um Manual de Instruções.

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